quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Escola suspende oração após reclamações de pais


Correio Braziliense Web, 20.08.2011.

“Papai do Céu, eu agradeço.” Os agradecimentos são encerrados com a expressão “amém”. O ato religioso desencadeou uma polêmica entre pais de alunos entre 3 e 5 anos do Jardim de Infância da 404 Norte. A tradição existe há 47 anos, mas foi interrompida na última segunda-feira, após uma denúncia na Ouvidoria da Secretaria de Educação do DF. De um lado, estão pais que defendem o momento de gratidão. Do outro, os que alegam a laicidade do Estado e afirmam que a religião deve ser tratada de forma facultativa, a partir do ensino fundamental. A Secretaria de Educação garante que as escolas públicas devem abordar os valores humanos, sem focar em religião.

Segundo a diretora da escola, Rosimara Albuquerque, o momento da acolhida é feito no início do turno escolar. A finalização ficava por conta de um aluno fazendo os agradecimentos. “Eles faziam orações espontâneas e relatavam os agradecimentos a Deus, com a religiosidade que traziam de casa. Mas isso estava ofendendo alguns pais e alunos”, contou a diretora. Há seis anos como gestora da escola, Rosimara garante que essa é a primeira vez que o momento religioso é questionado. “Todos sempre adoraram, mas esse ato não ocorre desde segunda-feira. Agora, queremos entrar em um consenso de acordo com o que estabelece a lei”, disse.

Conforme a Secretaria de Educação, os 180 pais do Jardim de Infância da 404 Norte se dividem em ateus, budistas, politeístas e cristãos. Oito deles defendem o fim da atividade com teor religioso dentro da escola. “As crianças têm entre 3 e 5 anos. Será que esse é o momento de lidar com isso dentro da escola?”, questiona Heliane Batista Carvalho, 40 anos, mãe de um menino de 4 anos. A radialista conta que o filho canta músicas com o nome de Jesus. “Ele aprendeu na escola. Tenho o direito e a prerrogativa de o meu filho ter educação religiosa apenas familiar” afirma.

Para o secretário adjunto de Educação, Erasto Fortes, a atitude do jardim de infância infringe a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). “A legislação é muito clara, em que acolhe o ensino religioso como matéria facultativa, com início nos ensinos fundamental e médio. As escolas de ensino público não podem fazer nenhuma atividade religiosa obrigatória a todos os alunos”, informou.

A psicóloga Márcia Bandeira de Souza Rocha, 34 anos, estudou no Jardim de Infância da 404 Norte há 30 anos. Hoje, o filho dela, Miguel Rocha, 4, aprende no mesmo lugar. A criança está matriculada na escola há dois anos e sempre participou dos momentos religiosos. “É uma hora de pausa para dividir sentimentos de proteção, amor e carinho. A escola é um ambiente de socialização entre as crianças, que são de todas as religiões e culturas”, conta.

A psicóloga está responsável por colher assinaturas para um abaixo-assinado, pelo qual os pais reivindicam a permanência da oração na entrada das crianças; a continuidade das festas cristãs, como Natal e Páscoa; e também o ensino de músicas que falam de Deus. O documento conta com 110 assinaturas. Na próxima semana, uma reunião com os pais, os funcionários da escola e representantes da Regional de Ensino deve decidir o futuro do momento de agradecimento do Jardim de Infância da 404 Norte.

Exigências
A Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. O artigo 33 determina que "o ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo". A lei diz ainda que, para definir os conteúdos do ensino religioso, os sistemas de ensino devem ouvir entidades civis, constituídas pelas diferentes denominações religiosas.


Nota: Realmente, essa interpretação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional foi bastante abrangente e considerou a oração diária com os pequenos alunos como ensino religioso. Entendo e respeito a opinião dos pais que destacam o respeito à liberdade de crença, mas talvez a atitude não precisasse ser tão incisiva. Não me parece, de forma alguma, aula de ensino religioso o que era praticado na escola citada. Dá a impressão de ser um momento em que os alunos espontaneamente faziam orações e, os que não foram assim ensinados, certamente não sofriam qualquer coação ou obrigatoriedade de exercer prática religiosa.
Agora é inegável que a religião faz parte da cultura de qualquer povo e não pode ser simplesmente negada ou desprezada. Que as escolas públicas, então, criem algum mecanismo de ensinar valores morais aos estudantes, pois isso está em grande falta, não apenas nos estabelecimentos de ensino (que refletem, a bem da verdade, o que acontece antes), mas nas famílias. Essa seria uma contribuição importante. O estado é laico mesmo, até por força de lei, mas a religiosidade faz parte do cotidiano dos brasileiros. E essa harmonização precisa ser discutida de uma maneira mais séria e sem preconceitos.

Fonte: http://www.felipelemos.com

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